20120206

Nascidos para competir

Esta prosa de um pai e educador, é uma constatação de espanto. Parece que os nossos infantes se dedicam desde a mais tenra idade à não mui nobre arte da competição. Com a entrada no ensino primário constatei que a minha filha e os seus jovens colegas, lutam ferozmente entre si pelas melhores notas. Como não sou competitivo, nem no lar tal lhe foi ensinado, assumo que tal se deva à pressão social para serem bem sucedidos a que estão sujeitas as nossas crianças, uma geração de filhos únicos, habituados a centrar as atenções e os mimos.

Como não exerço actividade no ensino, questionei a professora. Não seria melhor tomar uma atitude ligeiramente displicente relativamente às fichas e trabalhos das crianças. A jovem de 20 e poucos anos manifestou impotência e não avançou explicações capazes. Constatou que, mesmo não atribuindo "notas" aos trabalhos e testes, os petizes comparavam-se, ganhando o que tinha cometido menor número de erros.

Não encontro lógica que explique este fenómeno, nem sei se é localizado. Constato apenas factos, isto é, estamos a criar uma geração que desde a mais tenra idade vive obcecada com o sucesso e que negligencia os valores da solidariedade e partilha. O objectivo, primeiro e último, é sempre ser o melhor. Ao partilhar esta reflexão num fórum de educadores, procuro respostas. É geracional e restrito ou transversal? Mais frequente no ensino privado ou de idêntico teor no público? Deixo aqui esta reflexão parental, este desabafo, à espera de eco de quem se encontra do lado dos docentes.

8 comentários:

Miguel Pinto disse...

Creio que é urgente desmistificar a competição. Digo porquê aqui: http://olhardomiguel.wordpress.com/2012/02/06/desmitificar-a-competio/

Moriae disse...

Respondo o que respondi no teu blogue, Miguel Pinto (e na mesma, afirmo que esta resposta é a primeira):

Este Pai não me parece nada confuso. E este teu post merece resposta cuidada. O que farei em breve. E viva a discussão salutar :)

Só uma achega ... fui educada num modo privilegiado. Porque para além da escola, liceu, fiz o conservatório (música). E mais privilegiada fui por me ter sido ensinado e demonstrado, que tocar melhor e ser melhor aluna dava enorme bem estar. E hoje em dia, quase que me irrita ter sido assim privilegiada. Mas vivemos neste mundo de ...

E ao Fernando, concordo ctigo e tenho essas questões.

Fernando Lopes disse...

Miguel,

Os conceitos que exprimiste no teu post podem fazer algum sentido para adultos, mas em crianças, como pai, deixam-me preocupado. É uma espécie de "darwinismo escolar". A competição faz parte da vida, todos competimos, nem que seja com nós mesmo. Mas detectar estas características numa criança de 6 anos é preocupante. Aos 6 deve ser-se despreocupado e solidário, não competitivo. Que raio de adultos serão eles, se tudo é competição e nada é paixão?

Abraço

Miguel Pinto disse...

Aguardo pela resposta, Moriae.

Fernando,
1. Como se deve inferir do que escrevi no meu post, as formas competitivas das crianças e jovens devem diferir das competições dos adultos porque se considera que as crianças não são adultos em miniatura;
2. A solidariedade pode, e deve, ser promovida nas competições das crianças e jovens. Competição e solidariedade não são antónimos.

Abraço.

Fernando Lopes disse...

Na teoria competição e solidariedade não são antónimos, na prática a história é outra. Competição aos 6 anos não significa rivalidade saudável, é pura e simplesmente um modo de afirmação, diminuindo o outro, porque se é melhor. Permite-me discordar com a tua forma de encarar o mundo. Na escola nunca fui competitivo nem me interessava ser o melhor, apenas passar. Era uma coisa para se fazer, não para brilhar, os melhores eram uns grande totós, marrões, que eram desprezados ou tolerados. A competição só a vi nos últimos anos de faculdade, de um modo ténue, e aí era a luta por um emprego melhor. Repara que a minha discordância pode estar envenenada pela minha personalidade pouco dada a competições. São apenas maneiras diferentes de ver o mundo.
E viva a pluralidade.

Abraço,

Moriae disse...

Como diz o Fernando, viva a pluralidade. E Miguel, até amanhã (hoje, estive distraída e ... prefiro responder-te na calma). E depois o post é do Fernando mas ... Sei que ele me perdoa : )

Círculos saudáveis : )
: )

Miguel Pinto disse...

Fernando,
A competição não é má só porque há quem a faça selvagem, assim como um repasto não é mau só porque existe a probabilidade, por mais remota que seja, de nos conduzir à obesidade.

Julgo perceber as tuas reservas quanto às formas competitivas exacerbadas. Mas é um exagero afirmar que a competição visa apenas seleccionar os melhores.

Não resisto a uma provocação, Moriae: como melhorar o desempenho musical, como dominar as destrezas musicais, se o artista, ou pretendente, não se desafiar a si próprio vencendo as suas dificuldades e ultrapassando as suas fragilidades? ;)

Abraços aos dois.

Moriae disse...

Miguel, para mim aquilo que referes, acerca do desempenho musical e pessoal nada tem a ver com competição. E concordo com a ideia de nos melhorarmos, não poderia ser de outra forma! : )
Eu não aprecio competição, nem a desportiva. Aquela coisa do ganhar e tal e tal não me diz nada. é claro que é bom as pessoas saberem que melhoram, que desempenham bem etc.
E não acho que esse espírito seja bom para as crianças. Nem para os adultos. Outros valores deveriam ser favorecidos e desenvolvidos. Por exemplo esse, da pessoa se ir melhorando (e suas destrezas) pelo que isso trás de bom. É meio utópico, eu sei. Mas tb sei que há quem assim pense : )

Abraço! :)