20111010

A "Democracia" portuguesa no seu melhor

Eis a "Democracia" portuguesa no seu melhor:

- quatro em cada dez pessoas não quiseram ou puderam dizer o que pensam da direcção actual da Região Autónoma da Madeira. Seria, a esse título, relevante saber por que razão não votam nestas eleições os milhares de cidadãos nascidos e inscritos nos cadernos eleitorais da região (se, por comparação, é possível a um migrante português eleger o seu presidente, por que razão não é possível a um migrante madeirense participar destas eleições?). De qualquer modo, interessa registar esse dado: apenas pouco mais de metade dos eleitores elegeu, de facto, alguém;

- recompensou-se, claramente, nestas eleições o discurso do ódio, o discurso negativo, o discurso sancionatório. De um lado, o responsável material e moral da reiterada prática de enganar tudo e todos no que respeita a contabilidade da região; uma pessoa que insulta quem for preciso (e os jornalistas são presa frequente do seu discurso ordinário), que desrespeita qualquer instituição que se intrometa entre a sua agenda e o dinheiro necessário para mantê-la; uma pessoa que não tem pela inteligência dos seus conterrâneos nem o respeito nem a elegância de lhes explicar que o seu nível de vida é artificialmente mantido por benefícios retirados aos restantes cidadãos do país de que se recordam fazer parte apenas quando convém. Alguém que, deprimentemente, continua a retirar dividendos da predisposição de alguns madeirenses para a (contra-)discriminação dos "continentais", esse colectivo indistinto que parece apenas movido pela agenda da "retirada de direitos legítimos adquiridos pelos madeirenses". Interessa pouco quem mantém realmente a liquidez dessa garantia. E seria irónico se estivesse de facto ao alcance da inteligência de alguns o facto de usarem para criticar a acção do "Estado Central" o mesmo discurso sindicalista ("direitos adquiridos") utilizado pelos mesmos "cubanos" a quem se rejeita cronicamente. Do outro, a imagem não é melhor: uma coluna de partidos e sensibilidades políticas que nunca soube encontrar as pontes necessárias entre si para dar (pelo menos) a ilusão de querer trabalhar em conjunto, preferindo atacar o actual titular do cargo em detrimento da apresentação das políticas em que demonstrariam ser melhores que ele; um conjunto de pessoas que, estrategicamente, fizeram mais o elogio de si próprios que das suas ideias, das suas sugestões, das suas soluções;

- assistiu-se, pela enésima vez, à realidade do exercício do direito ao voto aliciado, quando não coagido; perante instituições como a CNE, cujo mandato é muito claro mas a vontade de cumpri-lo nem tanto. Fica por saber de que forma será, no curto prazo, "recompensada" essa incapacidade primária para enquadrar, à luz da lei, um acto eleitoral independentemente da região em que decorre. Mas, e retomo o raciocínio, reproduziu-se a impunidade habitual de quem age em eleições com o desplante de as reduzir a uma formalidade necessária e indigna do nome que enverga, para não dizer do esforço de quem, no passado, a tornou possível: e de uma forma tão torpe e absolutamente desligada de qualquer sentido de cumprimento das normas que roçou o patético ouvir ao Presidente da Região Autónoma da Madeira assumir ser "sempre assim". Colocados perante a evidência de que os cidadãos não são todos iguais perante a lei, como "garante" a Constituição (e considerando que, materialmente, ainda garante o que quer que seja), não espero menos dos meus concidadãos a mais absoluta e cristalina desobediência civil, obrigados que passam a não estar a cumpri-la também. Obviamente, não sou ingénuo ao ponto de considerar que o farão: nestas coisas do Absolutismo eleitoralmente enquadrado, o caprinismo nacional conforta-se em demasia na sua condição caprina;

- finalmente, entre aqueles que "apanham as canas da festa", os "enquadradores do regime" a quem diariamente é dado o direito à legitimação de tudo via media, grassou novamente a máxima deslegitimadora "rouba mas faz" e é "compreensível" que o eleitor, movido pelo egoísmo com o qual associa a condição de cidadão, vote com a carteira e não com a consciência, reconduzindo no cargo a habilidade de sonegar aos outros o que não produz sozinho desde que o eleitor colha dessa fraude algum benefício individual. Para uma parte demasiado significativa (e significativa também por ser demasiada) dos comentadores políticos mediáticos e mediatizados, a real politik demitiu-se definitivamente de qualquer consideração moral: o eleitor é egoísta, não se importa de viver com a consciência de que quem paga o seu estilo de vida são os outros, e a "democracia" é isto mesmo, ponto final. Se provas faltassem de que esta República caminha a passos largos para a obsolescência (e já é lisonjeiro considerar que ainda caminha, ou de que caminha nessa direcção em vez de já se encontrar nela), temos agora certeza quanto ao ramalhete composto: eleitos corruptos, eleitores interesseiros, comentadores que, legitimando-os, se consideram legitimados.

Este é o país que me deram para viver, para observar, para compreender. Onde anda o seu livro de reclamações, e a quem a dirijo? É que depois de ter tentado resolver o problema agindo sobre ele, começo a reconhecer a limitação das minhas capacidades e direitos, e a necessidade de alguém que o desentupa.

1 comentário:

Moriae disse...

Muito bem vindo! : )